República Popular da China – Região Administrativa Especial de Macau: Declaração do corpo técnico ao término da missão do Artigo IV relativa a 2024

11 de março de 2024

A declaração final descreve as conclusões preliminares do corpo técnico do FMI ao término de uma visita oficial (ou ‘missão’), na maioria dos casos a um país membro. As missões são realizadas como parte de consultas regulares (em geral, anuais) ao abrigo do Artigo IV do Convénio Constitutivo do FMI, no contexto de um pedido de utilização de recursos (empréstimo) do FMI, como parte das discussões de programas monitorizados pelo corpo técnico ou de outra forma de acompanhamento da evolução económica pelo corpo técnico.

As autoridades autorizaram a publicação desta declaração. As opiniões expressas na presente declaração são as do corpo técnico do FMI e não representam necessariamente as opiniões do Conselho de Administração do FMI. Com base nas conclusões preliminares desta missão, o corpo técnico irá elaborar um relatório que, uma vez aprovado pela direção, será apresentado ao Conselho de Administração do FMI para discussão e tomada de decisão.

 

Washington, DC: A reabertura da China, no início de 2023, deu um novo fôlego à economia da RAE de Macau depois do impacto da pandemia. O setor do jogo vivenciou uma forte retoma, embora o desempenho dos restantes setores económicos tenha sido menos marcante. Apesar do forte crescimento, a inflação permaneceu em níveis baixos. O forte crescimento deverá manter-se, em 2024. A curto prazo, as políticas devem centrar-se no apoio à recuperação total da economia, no reforço da estabilidade financeira e na aplicação de políticas proativas para gerir os riscos financeiros emergentes. A médio prazo, a prioridade será facilitar a diversificação e reequilíbrio do setor externo da economia, e aumentar a sua resiliência a choques futuros mediante o reforço, tanto ao nível de reformas como de investimento público, em capital humano e infraestruturas resilientes às alterações climáticas.

I. Desenvolvimentos recentes, perspetivas e riscos

A retoma da atividade económica, em 2023, foi considerável. O crescimento da economia da RAE de Macau, em 2023, foi de 80,5%, impulsionado por um aumento nas exportações de serviços, após o levantamento das medidas de contenção da COVID-19 por parte da China continental. O setor do jogo teve um desempenho excecional, estimulado pelo segmento de turismo de massas. As exportações de serviços não relacionados com o jogo também foram alvo de uma elevada expansão. Porém, o dinamismo do crescimento abrandou, no último trimestre de 2023, e a recuperação foi irregular, por força de um crescimento menos marcante noutros setores não relacionados com o jogo. As taxas de juro elevadas e o aumento da concorrência do comércio eletrónico e das regiões vizinhas do Continente limitaram a recuperação das pequenas e médias empresas (PME) locais. A inflação global oscilou em torno de 1%, em 2023, devido à queda dos preços das rendas. Com a recuperação económica, a política orçamental consolidou-se, em 2023, devido à retirada das medidas de combate à pandemia, ao aumento das receitas do jogo e à subexecução das despesas correntes. A Autoridade Monetária de Macau (AMCM) aumentou a taxa básica em 525 pontos base, desde março de 2022, na sequência de aumentos semelhantes da Autoridade Monetária de Hong Kong e da Reserva Federal dos EUA.

Em 2024, prevê-se que o crescimento continue forte. A previsão de crescimento do PIB de 13,9%, devido à recuperação adicional do setor do jogo e a investimentos privados fortes, em parte ligados ao compromisso das concessionárias de jogo de investir em setores não relacionados com o jogo. O PIB deverá regressar ao nível pré-pandemia, em 2025. A trajetória de crescimento a médio prazo depende do ritmo da integração da RAE de Macau na Região Metropolitana da Grande Baía e do sucesso dos esforços de diversificação económica. Segundo as projeções, o crescimento convergirá para 3%, a médio prazo. Com o estreitamento do hiato do produto e o aumento dos salários, projeta-se que a inflação acelere para 1,7%, em 2024, e estabilize em torno de 2,5%, no médio prazo. O excedente da balança corrente deverá estabilizar em torno de 30% do PIB, suportado pela retoma das exportações de serviços. A posição externa da RAE de Macau é considerada substancialmente mais forte do que o que apontam os fundamentos de médio prazo e as políticas desejáveis, o que reflete em parte a elevada poupança preventiva e os investimentos moderados.

Subsistem riscos de revisão em baixa das previsões. O abrandamento acima do previsto no setor imobiliário, os problemas financeiros e o declínio do investimento por parte do governo local ou o aumento das tensões geopolíticas poderão reduzir a atividade económica na China continental, com efeitos colaterais no sistema financeiro e na economia da RAE de Macau. O prolongamento das taxas de juro elevadas nas principais economias pode pressionar os balanços dos bancos desta região devido ao impacto na avaliação e qualidade dos ativos. Os elevados passivos externos dos bancos da RAE de Macau com prazos curtos podem comportar riscos. Os centros de jogo emergentes noutras partes da Ásia poderão reduzir o turismo para a região a médio prazo. Os fenómenos climáticos extremos causados pelo aumento das temperaturas podem afetar negativamente infraestruturas críticas, instituições financeiras e empresas. No lado positivo, o crescimento pode ser impulsionado pela forte recuperação do setor do jogo e uma integração na Região Metropolitana mais rápida do que o previsto.

II. Políticas Económicas 

Política orçamental

Um ritmo de consolidação orçamental mais lento ajudará a atividade económica no setor não relacionado com o jogo e reforçará a sustentabilidade do crescimento a médio prazo. A política orçamental deverá continuar a consolidar-se em 2024, com a diminuição das despesas de investimento e o um aumento substancial das receitas públicas. O ritmo desigual da recuperação dos setores do jogo e não jogo e um hiato do produto negativo exigem um apoio governamental contínuo. Além disso, é necessário aumentar a despesa pública em infraestruturas resistentes às alterações climáticas, bem como na educação e nos cuidados de saúde, de modo a apoiar a diversificação da economia e o reequilíbrio do setor externo. Dado o baixo nível de despesa pública da RAE de Macau em relação ao PIB (menos de metade da média da OCDE), a margem para atingir estes objetivos por via da reafetação de despesas é limitada e a consolidação prevista condicionará ainda mais a capacidade do governo para os atingir. Um ritmo de consolidação mais lento poderá apoiar a recuperação económica ainda em curso, resolver os estrangulamentos à diversificação e reforçar a resiliência económica às alterações climáticas, sem riscos indevidos para a situação orçamental.

Além disso, o desenvolvimento de um quadro orçamental de médio/longo prazo (QOMLP) credível ajudará a gerir melhor os compromissos decorrentes das múltiplas exigências em matéria de recursos orçamentais. A exigência de equilíbrio orçamental estipulado na Lei de Bases ampara a sustentabilidade orçamental a médio prazo da RAE de Macau e tem contribuído para a sua forte posição orçamental. Porém, a necessidade de diversificar a economia da região e aumentar a sua resiliência às alterações climáticas exige um planeamento avançado, a priorização e execução de projetos plurianuais, bem como a afetação de recursos a esses projetos. O QOMLP provê uma plataforma de integração de todas as decisões orçamentais num quadro categorizado com prioridades claras a curto e médio prazo e etapas para garantir a eficiência das despesas e das políticas fiscais. Estas orientações e planos ajudarão a gerir melhor os compromissos decorrentes de múltiplas exigências em matéria de política orçamental, incluindo para projetos plurianuais.

Políticas do setor financeiro

Apesar do aumento considerável do crédito malparado, o sistema bancário da RAE de Macau mantém-se resiliente graças às suas elevadas reservas de capital e liquidez. O crédito malparado aumentou 2,1 pontos percentuais, para 3,8%, no final de 2023, devido sobretudo à exposição dos bancos ao setor imobiliário do continente e à confluência de taxas de juro elevadas e um ritmo lento de recuperação em alguns segmentos da economia. Contudo, de acordo com os testes de esforço realizados pelo corpo técnico do FMI, o sistema bancário é capaz de resistir a grandes choques sobre a qualidade dos ativos, o valor das garantias, as taxas de juro e a saída de depósitos. Além disso, este sistema bancário deverá manter-se resiliente ao contágio de uma nova contração no setor imobiliário do continente, o que poderá desencadear a depreciação do RMB e um novo aumento do crédito malparado devido à exposição dos bancos da RAE de Macau ao continente. Os testes de esforço, porém, indicam que alguns bancos sem importância sistémica podem ser vulneráveis a um cenário de queda significativa do valor dos ativos de garantia e de grande aumento do crédito malparado.

Devem ser tomadas políticas proativas para reforçar a solidez do sistema financeiro e gerir os riscos emergentes.

  • É importante que se reduza gradualmente a intervenção de políticas no sistema bancário e não se estendam as moratórias relacionadas com a pandemia, para além de 2024.
  • O incentivo a uma maior constituição de provisões por parte das instituições de crédito ajudá-las-á a resistir a uma maior deterioração da qualidade dos ativos.
  • A melhoria dos quadros em matéria de insolvência e resolução e reestruturação da dívida, incluindo soluções extrajudiciais especiais, pode evitar sobrecarregar o sistema judicial e facilitar a saída de empresas inviáveis.
  • A recolha de dados, banco a banco, sobre o crédito malparado, por setor económico e crédito interbancário, melhorará a avaliação do risco sistémico efetuada pela AMCM. Será fundamental que se reforce a monitorização do risco dos mutuários da China continental, a posição de liquidez dos bancos com grandes passivos estrangeiros de curto prazo e o setor financeiro não bancário.

As autoridades devem encontrar um equilíbrio entre a modernização do sistema financeiro e a gestão dos riscos conexos. A Lei do Sistema Financeiro (LSF) revista flexibiliza o quadro jurídico da RAE de Macau em matéria de regulação e supervisão financeiras e estabelece uma base jurídica para a promoção da inovação financeira, embora algumas disposições se afastem das melhores práticas internacionais. A inclusão de um quadro de resolução sólido para as instituições de crédito sujeitas à LSF, assente na independência operacional da AMCM, permitirá uma resolução eficiente dessas instituições. As condições para a concessão de licenças a bancos com âmbito restrito devem ser adequadas ao fim a que se destinam e estabelecidas de forma prudente para gerir potenciais riscos de concentração. Devem ser introduzidas salvaguardas na orientação relativa à concessão de isenção de requisitos de supervisão às entidades qualificadas comprometidas com a inovação financeira. O uso de critérios rigorosos para a prorrogação do prazo de validade da autorização temporária para a inovação financeira proporcionará um nível adequado de salvaguardas.

As medidas das autoridades de reforço do quadro CBC/FT são bem-vindas e devem ser apoiadas. A avaliação atualizada dos riscos de branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo e da proliferação (BC/FT/FP) na RAE de Macau é positiva. É pois de saudar a LSF revista e a Lei dos Fundos Fiduciários que reforçam as exigências de licenciamento e adequação para o setor financeiro e permitem que apenas instituições financeiras reguladas em matéria de CBC/FT atuem como administradores. As autoridades deverão continuar a melhorar a investigação e a instauração de medidas penais em matéria de branqueamento dos produtos do crime estrangeiros, nomeadamente através do setor dos jogos de fortuna e azar. Será igualmente importante garantir que a disponibilidade imediata e atempada de informações exatas sobre beneficiários efetivos.

Políticas estruturais

São necessárias reformas abrangentes que permitam à RAE de Macau aproveitar as oportunidades oferecidas pela integração na Região Metropolitana da Grande Baía. A região de Guangdong tem uma extensa base de conhecimento, que vai além dos setores visados pelo governo. Reformas estruturais em toda a economia, que melhorem a eficiência e a afetação de recursos, permitirão à RAE de Macau capitalizar a base de conhecimento disponível na Região Metropolitana. As autoridades devem estar cientes das possíveis repercussões negativas, distorções do comércio e riscos de governação relacionados com as suas políticas industriais (PI). Uma análise custo-benefício sólida, combinada com mecanismos transparentes de seleção de projetos, avaliações regulares e cláusulas de caducidade claramente definidas para garantir a eliminação progressiva das políticas, ajudará a minimizar as externalidades negativas das PI. As medidas tomadas pelas autoridades para facilitar a diversificação devem ser coerentes com as regras da OMC.

A digitalização e a inovação têm potencial para aumentar a produtividade da RAE de Macau e apoiar a diversificação económica. Um estudo recente do FMI sugere que as empresas asiáticas mais inovadoras e digitalizadas tendem a ser mais produtivas. A RAE de Macau registou um aumento significativo da digitalização na última década, embora ainda esteja aquém dos seus congéneres regionais. Melhorar a conceção e o direcionamento dos incentivos fiscais à I&D de Macau, aumentar a despesa pública em investigação básica e o acesso das PME ao financiamento e às tecnologias digitais ajudará a apoiar ainda mais a digitalização e a inovação. O aumento do investimento público na formação prática e profissional e o reforço das ligações entre a ciência e as empresas reduzirão a falta de qualificações. A simplificação das exigências administrativas para a contratação de trabalhadores qualificados não residentes poderá ajudar a competir por talentos estrangeiros. O reforço da previsibilidade regulamentar, a eficácia do poder judicial, a proteção dos direitos de propriedade e a simplificação das regulamentações do trabalho e empresariais melhorarão o ambiente de negócios da RAE de Macau.

A implementação diligente dos planos governamentais de proteção ambiental e prevenção de desastres ajudará a proteger contra catástrofes naturais dispendiosos. A RAE de Macau formulou planos de proteção ambiental e prevenção de desastres, incluindo o reforço das infraestruturas de prevenção e mitigação de catástrofes naturais, a melhoria do sistema de gestão de emergências, bem como o reforço da capacidade de gestão, monitorização e alerta precoce contra riscos. As autoridades devem continuar a aplicar as medidas de adaptação e prevenção, realizar uma avaliação exaustiva das necessidades de investimento para a adaptação e assegurar a integração adequada do financiamento destes projetos no plano orçamental a médio prazo.

A missão gostaria de agradecer às autoridades e outros interlocutores da RAE de Macau pelas excelentes discussões e pelo apoio organizacional ao longo da visita.

[1] Uma missão do FMI, liderada por Ara Stepanyan e composta também por Pablo Gonzalez Dominguez e Danila Smirnov, levou a cabo reuniões, na Região Administrativa Especial de Macau, entre os dias 21 de fevereiro e 6 de março de 2024. A missão reuniu-se com o presidente da Autoridade Monetária de Macau (AMCM) e com outros altos funcionários, e com representantes da comunidade empresarial, académica e do setor financeiro.

Departamento de Comunicação do FMI
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