Financiamento das economias africanas: Observações da Diretora-Geral para a Sessão Plenária

20 de maio de 2021

Excelências, Senhoras e Senhores, caros amigos.

Os líderes africanos e os amigos de África têm hoje um objetivo comum: que África regresse aos notáveis progressos em matéria de desenvolvimento que testemunhamos antes da pandemia. E que tire pleno partido das mudanças tectónicas na economia mundial no sentido de um crescimento baseado na tecnologia digital, de baixo carbono e resiliente às alterações climáticas.

É urgente centrar a atenção no financiamento de África. No ano passado, a recessão provocada pela pandemia diminuiu o PIB do continente em 1,9% – o pior desempenho de que há registo. Este ano, projetamos um crescimento mundial de 6%, mas apenas metade deste valor (3,2%[1]) em África.

Trata-se de uma divergência perigosa. Deveria verificar-se o inverso: África precisa de crescer mais rapidamente do que o resto do mundo – entre 7% e 10% – para satisfazer as aspirações das suas populações jovens e tornar-se mais próspera e mais segura.

Sim, em conjunto evitámos uma crise económica muito mais grave. Agora, temos de aproveitar este dinamismo inicial para pôr termo à pandemia de forma duradoura e estimular o crescimento em África. Por outras palavras, o momento exige uma injeção de equidade: uma vacina no braço para todos, em todo o lado, e uma oportunidade justa de um futuro melhor.

Qual é o preço desta injeção de equidade? No FMI, estimamos que as necessidades de financiamento adicionais de África para dar uma resposta adequada à Covid-19 ascendem a cerca de285 mil milhões de dólares até 2025. Destes,135 mil milhõesde dólares seriam destinados aos países de baixos rendimentos. Este valor é o mínimo estritamente necessário. Para alcançar mais – para que as nações africanas regressem à sua trajetória anterior de convergência com os países ricos – será necessário aproximadamenteo dobro. Publicamos hoje uma nota com mais pormenores1.

São valores elevados e podem parecer inatingíveis. Mas para citar Nelson Mandela: tudo é impossível até ser realizado. Indico aqui três áreas nas quais podemos agir agora.

Em primeiro lugar, acabar com a pandemia em todo o mundo. Podemos visar a vacinação de pelo menos 40% da população de todos os países até ao final de 2021 e de pelo menos 60% até meados de 2022.

O argumento económico é esmagador: com um custo de 50 mil milhões de dólares, uma vacinação mais rápida pode resultar num aumento de 9 biliões de dólares do produto mundial entre agora e 2025. Tal exigiria, entre outras ações prioritárias, a doação de 500 milhões de vacinas em 2021 pelos países com doses excedentes. E requer o aumento da capacidade de produção de vacinas em 1 mil milhões de doses no início de 2022.

Em segundo lugar, é necessário aumentar o financiamento bilateral e multilateral do desenvolvimento (donativos e empréstimos concessionais). Hoje, teremos a oportunidade de ouvir os parceiros para o desenvolvimento de África. Permitam-me apresentar o contexto e explicar como o FMI fará a sua parte.

Ao longo do último ano, intensificámos rapidamente o nosso financiamento ao continente, concedendo, nomeadamente, um montante 13 vezes superior à nossa média anual de empréstimos à África Subsariana. E estamosatrabalhar com os nossos países membros para fazer muito mais. Recebemos apoio para aumentar os limites de acesso, a fim de intensificar a nossa capacidade de concessão de empréstimos à taxa zeroatravés doPrograma de Financiamento para a Redução da Pobreza e Crescimento.

Reconhecemos que tempos excecionais exigem medidas excecionais. Osnossos países membros apoiam uma nova alocação sem precedentes dedireitos de saque especiaisno valor de 650 mil milhões de dólares, de longe a maior da nossa história. Uma vez aprovada, o que estimamos alcançar no final de agosto, tal alocação irá disponibilizar direta e imediatamentecerca de 33 mil milhões de dólaresaos nossos países membros africanos. Tal fomentará as suas reservas e liquidez, sem aumentar a sua carga da dívida.

Eestou muito esperançada com as indicações de vários países avançados e de mercados emergentes quanto à sua intenção de retrocederparte dos seus novos DSEem condições altamente concessionais. Fazê-lo através de mecanismos como o Programa de Financiamento para a Redução da Pobreza e Crescimento ampliará o impacto da alocação aos países necessitados. Ao longo do último ano, ganhamos experiência em facilitar a retrocessão de DSE e, dessa forma, conseguimos triplicar a nossa capacidade de concessão de empréstimos concessionais. Confio, assim, no desenvolvimento desta fonte de financiamento a baixo custo para satisfazer as necessidades substanciais de África, incluindo em matéria de vacinas.

E estes esforços têm de ser complementados pelo alívio da dívida. A Iniciativa de Suspensão do Serviço da Dívida ajudou. São agora necessários esforços consideráveis paratornar o quadro comum de resolução da dívida plena e rapidamenteoperacional. Como é do Vosso conhecimento, três países solicitaram o tratamento da dívida: Chade, Etiópia e Zâmbia. Espero que as discussões em curso sobre o tratamento da dívida do Chade – o primeiro caso ao abrigo deste quadro – nos conduzam a um arranque construtivo.

Em terceiro lugar, ações a nível nacional. Uma crise é uma oportunidade para reformas internas transformadoras que aumentem as receitas internas, melhorem os serviços públicos e reforcem a governação. A digitalização, por exemplo, pode melhorar a administração tributária e a arrecadação de receitas, bem como a qualidade das despesas públicas. E com uma transparência radical, África pode explorar novas fontes de financiamento – tais como as compensações de carbono.

Existe uma ampla margem para os países incentivarem o investimento privado, nomeadamente em infraestruturas sociais e físicas. Um novo estudo do FMI, publicado hoje,salienta que os investidores nacionais e internacionais poderiam disponibilizar financiamento adicional de pelo menos3% do PIB por anoaté ao final desta década.

As reformas da tributação internacional também podem apoiar o crescimento de África. Há muito que somos a favor de taxas de tributação mínimas do imposto sobre o rendimento das sociedades para reduzir o nivelamento por baixo e a evasão fiscal. Apoiamos também firmemente um acordo internacional sobre tributação digital, algo de que França tem sido o principal defensor. É importante assegurar uma distribuição equitativa das receitas fiscais para que possam contribuir para colmatar o défice financeiro de África.

Para concluir, cabe a cada um de nós e a todos redobrar os esforços. A história ensinou-nos demasiado bem o que um choque desta magnitude pode envolver se não for combatido com determinação e eficácia: pode conduzir a uma década perdida.

Quando era criança, ia ter com o meu pai e pedia-lhe conselhos sempre que tinha de fazer uma escolha importante. A sua resposta era sempre a mesma: faz a coisa certa. Sabemos o que é a coisa certa: agir para inverter a perigosa divergência das perspetivas económicas que África enfrenta atualmente. Vamos fazê-lo.

Muito obrigada.



[1] Excluindo o impacto da Líbia, que registou um grande aumento pontual da produção de petróleo.