Quando o Reino Unido deixar a União Europeia (UE), o aumento das barreiras ao comércio, aos fluxos de capital e à mobilidade da mão de obra afetará a produção e o emprego não apenas no próprio Reino Unido, mas também nos 27 países membros da UE. Uma vez que o Brexit significa o rompimento de uma relação econômica sem atritos, haverá custos para ambos os lados, como sugere nosso novo estudo [link].
Os vínculos entre a UE e o Reino Unido são profundos: o Reino Unido está entre os maiores parceiros comerciais da UE-27 e responde por cerca de 13% do seu comércio de bens e serviços. Além das relações comerciais bilaterais, existem importantes laços comerciais entre a UE-27 e o Reino Unido através de cadeias produtivas que envolvem vários países.
Os vínculos financeiros também são fortes: os fluxos bilaterais brutos de capital totalizavam cerca de 52% do PIB da UE-27 em 2016.
Os fluxos migratórios também se fortaleceram ao longo do tempo e são muito intensos no caso de alguns países, como a Irlanda.
A reversão da integração prejudicará o emprego e o produto na UE no longo prazo
Um índice construído para capturar todos esses canais de integração revela uma integração bilateral crescente entre a UE e o Reino Unido nos últimos 30 anos.
A reversão dessa integração na esteira do Brexit prejudicará a renda e o emprego na UE.
Se o Reino Unido e a UE optarem por um acordo de livre comércio (ALC) com tarifas baixas sobre o comércio de bens mas barreiras não tarifárias mais elevadas, estimamos que, em comparação com a situação atual, o produto real da UE-27 recuará em 0,8% e o emprego, em 0,3%, no longo prazo, levando em conta todos os canais de transmissão.
Se ambas as partes passarem a aplicar automaticamente as regras da OMC, a queda do produto real seria ainda maior, de 1,5% no longo prazo, enquanto o emprego cairia 0,7%. Se, porém, for adotada uma solução relativamente favorável semelhante à da Noruega (que pertence ao Espaço Econômico Europeu – EEE), com a manutenção do acesso ao mercado único mas a saída da união aduaneira, o declínio do produto e do emprego na UE-27 parece ser insignificante.
O golpe do Brexit: estimativas do impacto no comércio país por país
Quanto maior for o volume do comércio de um país com o Reino Unido, maior será o impacto do Brexit sobre o produto nacional. Para deixar isso mais claro, aplicamos a cada país um quadro específico que analisa os efeitos comerciais diretos e indiretos da elevação das tarifas e barreiras não tarifárias ao comércio de bens e serviços. Os efeitos simulados são relativamente menores em comparação com as estimativas apresentadas acima, uma vez que a estrutura do quadro leva em conta apenas as relações comerciais.
Constatamos que o produto real da UE-27 diminuiria 0,2% no longo prazo se fosse adotado um acordo de livre comércio; a economia mais afetada seria a Irlanda (cerca de 2,5%), seguida pelos Países Baixos, Dinamarca, Bélgica e República Checa.
Estima-se que esses impactos seriam mais profundos caso fossem aplicadas automaticamente as regras da OMC: a perda do produto da UE-27 chegaria a 0,5%, com uma perda de 4% na Irlanda em decorrência da elevação substancial das barreiras tarifárias e não tarifárias.
Nosso estudo não analisa o efeito da incerteza sobre a futura relação entre a UE-27 e o Reino Unido nem a transição para a nova relação. Ele se concentra exclusivamente no impacto no longo prazo, quando todas as partes terão se ajustado plenamente à nova relação. As consequências definitivas levarão anos para se concretizar e dependerão do tipo de acordo que vier a ser firmado entre a UE-27 e o Reino Unido.
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Jiaqian Chen é Economista do Departamento da Europa do FMI e trabalha nas perspectivas macroeconômicas do Reino Unido e em questões relacionadas ao Brexit. Anteriormente, trabalhou com a Suécia, Dinamarca, Turquia e Israel, e com políticas monetárias e macroprudenciais no Departamento de Mercados Monetários e de Capitais do FMI. Seus estudos têm como temas as macrofinanças, com um foco especial nas políticas macroprudenciais. É doutor em Economia pela London School of Economics.
Christian Ebeke é o Sub-representante Residente do FMI na União Europeia, em Bruxelas. Anteriormente, trabalhou no Departamento da Europa do FMI, na equipe da área do euro, e se dedicou a questões vinculadas a reformas estruturais. Entre suas muitas outras atribuições, trabalhou no setor fiscal da equipe encarregada da Polônia e avaliou países com programas do FMI no Departamento de Estratégia, Políticas e Avaliação. Publicou artigos sobre uma ampla gama de temas, como reformas estruturais, estabilidade macroeconômica, finanças internacionais, política fiscal, governança e migração internacional. É doutor pela Universidade de Auvergne, na França, e ingressou no FMI em 2011.
Li Lin é Economista na Unidade de Economias Avançadas do Departamento da Europa do FMI e trabalha nas perspectivas macroeconômicas, inflação e setor externo da área do euro. Anteriormente, participou da equipe encarregada da Romênia (país com um programa do FMI e sob supervisão intensiva) e trabalhou no Departamento de Mercados Monetários e de Capitais do FMI, onde se ocupou de testes de estresse e avaliações de risco sistêmico de países como África do Sul, Israel e Nepal. Doutorou-se pela Universidade de Oxford. Seus estudos têm como tema as macrofinanças e já publicou em Economic Theory, Journal of Banking and Finance, Journal of Financial Stability e Annals of Finance.
Haonan Qu é Economista na equipe encarregada da área do euro no Departamento da Europa do FMI e trabalha em reformas estruturais e questões relacionadas com o Brexit. Anteriormente, trabalhou com a Bósnia-Herzegovina no contexto de programas de crédito do FMI e fez parte das equipes encarregadas da Arábia Saudita e do Qatar no Departamento do Oriente Médio e Ásia Central. Além disso, trabalhou no Departamento de Estratégia, Políticas e Avaliação, onde analisou a concepção de programas, as políticas e os resultados no âmbito de vários acordos de empréstimo do FMI com os países membros durante a crise financeira mundial. Seus estudos têm como temas a macroeconomia e as finanças internacionais. É doutor em Economia pela Universidade da Califórnia, Berkeley.
Jesse Siminitz é analista de estudos no Departamento da Europa do FMI e atualmente se ocupa de questões financeiras e monetárias analisadas pela equipe encarregada da área do euro. Anteriormente, trabalhou em missões do Artigo IV a Montenegro e publicou estudos sobre políticas relacionados à reforma previdenciária, os governos municipais e a competitividade externa. Trabalhou também no Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, onde se ocupou da Argentina e do Uruguai. Seus estudos se concentram na política fiscal e nas finanças internacionais. É mestre em Economia pela Universidade do Estado da Carolina do Norte.